Abacaxi Pérola
Toda semana, uma velha carreta com uma armação de madeira na caçamba passava carregando uma montanha de abacaxis para vender na minha rua. Não sabíamos ao certo em que dia da semana ele passaria, pois os dias ainda não se pareciam em nada com o que vemos nos calendários hoje; mesmo assim, esperávamos ansiosos pelo dia em que passaria de novo, enquanto brincávamos pelas ruas do bairro. Para nós, aquela carreta antiga era como os caminhões de sorvete que víamos nos filmes americanos. Só que, é claro, uma versão brasileira deles. Mais tropical. Quando avistávamos a carreta vindo em nossa direção, era uma comoção. Corríamos atrás dela até que parasse. Um senhor descia do carro, abria a caçamba e dava uma fatia de abacaxi pérola para cada uma das crianças que não carregavam nem uma moeda no bolso. Nem sempre tinha quem aparecesse para comprar. Dava para dizer que o coração do senhor ficava mais cheio que a sua carteira. Não parecia ser nada lucrativo para ele, mas não podíamos evitar de pedir mais uma fatia, o abacaxi era docinho e suculento. Melávamos as mãos e limpávamos na roupa. Depois de comer, estávamos carregados e cheios de energia para passar o resto do dia sujando o resto de nossas roupas com terra e suor. Essa é uma memória que não parece ter sido há muito tempo atrás, mas que certamente é antiga. Hoje, estou mais velho. Mudei de cidade. Onde moro atualmente é muito maior. Gigante, eu diria. Na minha rua não passa nenhuma carreta gritando "abacaxi pérola". Isso não me fez parar de comê-lo. Toda quarta-feira, às 19:30, quando volto do trabalho, passo no mercado para comprar uma bandeja de abacaxi pérola. Eles vêm cortadinhos e protegidos por um plástico filme. Assim eu evito fazer uma zona na cozinha descascando. Também não como mais com as mãos, uso o jogo de talheres que comprei. Hoje, o abacaxi não é mais de graça, nem tão doce.